quarta-feira, 8 de maio de 2013

ABUSO DE PODER


Gritos de protesto, barulho de apitos, cartazes. Jovens realizam manifestação em busca dos seus direitos e paralisam o trânsito, causando congestionamento de veículos. No meio da confusão dois profissionais se destacam. De um lado a repórter com sua máquina fotográfica. Do outro, o policial militar e sua farda. Ambos exercendo suas respectivas funções.

Desde o princípio da manifestação, a repórter já estava presente. Fora avisada antecipadamente dos planos dos jovens. Entrevistou alguns dos manifestantes e quando eles de fato começaram a protestar, tirou a máquina fotográfica da bolsa e passou a registrar os acontecimentos.

Aos poucos os jovens foram interferindo no trânsito, impedindo que os veículos seguissem caminho. A viatura da polícia chega ao local e orienta carros, motos e ônibus, para melhorar o congestionamento. Conversam com os estudantes e, por se tratar de uma manifestação pacífica, permitem que eles prossigam durante mais algum tempo com o protesto.

Com o olhar direcionado para suas fotografias, a repórter busca os melhores ângulos para narrar, através das imagens, os fatos ocorridos. Tenta fotografar a viatura com os estudantes ao fundo, de modo a ilustrar a presença da polícia; um carro que segue seu caminho com a ajuda dos policiais; um soldado de costas, focando apenas no fundo do colete onde está escrito “polícia militar”... mas, é impedida de prosseguir com seu trabalho.

- Apague agora! – diz o policial para a repórter. – Vamos, apague! Não é para ficar tirando foto da polícia, não! – repete, de forma grosseira.

Foto: Ilustrativa (Reprodução)
Assustada com a reação do policial, a repórter segura seu crachá e a máquina fotográfica, tentando mostrar sua profissão, e como o trabalho que realizava não estava expondo nenhum dos policiais que participavam da operação.

- Mas a foto ... – tenta explicar.
- Não, apague! – repete o policial, levantando o seu tom de voz.

Tenta completar suas frases, explicando suas intenções, sua profissão, seu trabalho, mas por diversas vezes não consegue falar mais do que três palavras. É interrompida, todas as vezes, por um policial que se mostra avesso a um diálogo pacífico e tenta impor sua vontade sem demonstrar respeito nem pela cidadã, nem pela jornalista que se encontrava à sua frente.

Alguns jovens manifestantes começam a interferir na discussão. Pedem para que a repórter obedeça às ordens do PM e apague a foto desfocada, onde pode-se ver apenas as costas de um policial, onde lê-se “polícia militar”. Dividida entre a luta pelos seus próprios direitos e os pedidos dos manifestantes, a repórter decide apagar a foto, não, sem antes, anotar o nome do soldado que a havia tratado de forma tão grosseira.

Desde criança, sempre fora uma garota tranquila e obediente. Também estava acostumada com a farda marrom, o colete pesado e o coturno, que, vez ou outra, ficavam espalhados pela casa depois que seu pai chegava do trabalho. Não só pela sua índole, bem como pela relação que sempre teve com os policiais através de sua própria família, ela sempre teve respeito e admiração por esses profissionais, responsáveis pela segurança dos cidadãos e ordem na sociedade. Não conhecia o abuso de autoridade frequentemente praticado pelos mesmos.

Naquele mesmo dia, em frente ao seu computador, escrevendo e editando fotos para a matéria, ela relembrava o que viveu durante a manifestação. Ainda estava com aquela sensação ruim, típica de pessoas que não gostam de participar de discussões. Mas, apesar da sensação, conhecia seus direitos e sabia que não estava errada em tentar manter um diálogo com o policial e explicá-lo sobre suas intenções, mesmo que depois apagasse a imagem.

Como repórter, ela tinha garantido seu direito à liberdade de imprensa. De acordo com o artigo 5º, inciso IX, da Constituição Federal, “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença”. E como cidadã, ela tinha garantido o direito de ser respeitada. Não era por causa de uma farda que outro cidadão poderia infringir seu direito.

Depois de digitar o ponto final, observou sua matéria. Não publicou nenhuma foto da polícia, apenas informou a presença e o trabalho realizado pela mesma. Também não pretendia fazer nenhuma queixa ao comandante, ao seu pai ou a quem quer que fosse. Talvez algum dia pudesse esclarecer o episódio com o soldado, do qual nunca se esquecerá o nome. Mas não valia a pena prolongar e expandir uma situação que já havia passado e tinha sido “resolvida”.

O que valeu a pena foi a experiência vivida, que fez com que ela aprendesse na prática alguns dos desafios da sua profissão. Para evitar discussões, algo que ela detesta, avisará ao comando da operação, na próxima vez que precisasse fotografar a atuação da polícia. Mas ela não irá abrir mão dos seus direitos. Afinal, se todos conhecessem seus próprios direitos e deveres, haveria menos abuso de poder.


Um comentário:

Anônimo disse...

mas o policial tambem tem o direito de nao querer ser fotografado? ou to errado?